quarta-feira, 6 de outubro de 2010

MUNICÍPIOS

Comunidade quilombola está sem posto de saúde há 5 anos Atualmente a comunidade quilombola Mocambo em Porto da Folha vive um novo drama com relação à saúde dos moradores
Do Portal Infonet
Foto Infonet

Distante 165 km de Aracaju, o município de Porto da Folha abriga o povoado Mocambo nas margens do Rio São Francisco que é formado por uma comunidade remanescente do antigo quilombo que o local abrigava. Como descendentes quilombolas, por lei a comunidade tem direito a propriedade de suas terras das quais eles brigam para poder utilizar desde a década de 90. Mas atualmente a comunidade vive um novo drama com relação à saúde dos moradores. O posto de saúde do povoado está desativado há cerca de cinco anos. Os atendimentos dos médicos do Programa Saúde Família (PSF) que se deslocam até a comunidade são realizados na sacristia.
O prédio do antigo posto não oferece condições mínimas de uso e necessita de uma reforma urgente que se prolonga enquanto os moradores permanecem desassistidos.

Segundo o presidente Associação local Ademar Ricardo Rosa, o posto de saúde da comunidade está desativado há mais de cinco anos após a interdição da vigilância sanitária que constatou as péssimas condições do local. “Hoje nós desconhecemos o quesito saúde, nós não temos médicos para atender a população, quando vem um perdido por semana, às vezes ficamos um mês sem ter a visita do médico”, conta.
No final de abril a Defesa Civil de Porto da Folha vistoriou o prédio do antigo posto de saúde e atestou as condições como precárias. O laudo do engenheiro Cícero Leonardo de Menezes cita “A estrutura do Posto de Saúde se encontra totalmente em situação precária sem a mínima condição de funcionamento, com várias fissuras nas paredes de alvenaria e na base de sustentação do prédio com alto risco de desabamento, telhado muito danificado, banheiros destruídos, calçada com piso destruído e murada


prestes a desabar. Em conclusão a estrutura não oferece nenhuma condição de funcionamento sem que sejam feitas às reformas necessárias”, cita o laudo.
No dia 12 de agosto deste ano a prefeitura de Porto da Folha divulgou o resultado da licitação realizada através de uma carta convite no valor de R$ 11.788,47. “Tivemos que recorrer ao Ministério Público Federal para denunciar a situação, estivemos no mês de setembro com a procuradora e ela nos informou que o Prefeito mandou um ofício dizendo que a empresa que ganhou a licitação por um valor inferior a R$ 15000, o que não supre a necessidade do posto, porque não cabe reforma, mas uma construção porque está em Estado de decadência”, diz.


De acordo com a procuradora do Ministério Público Federal Lívia Tinoco a situação foi constatada e cobrada à prefeitura de Porto da Folha. “Eu estive lá em uma oportunidade, eles já tinham me falado sobre a situação do posto de saúde. Então encaminhei um ofício ao prefeito de Porto da Folha pedindo providências. A princípio eu imaginava que a responsabilidade do posto fosse da Funasa, o que não era o caso. Depois intimei o prefeito para ele me falar sobre a licitação de reforma da unidade”, destaca.
Outro problema é com relação a distribuição de medicamentos, já que desde o mês de março nenhum medicamento é encaminhado para os quilombolas, e para serem atendidos em caso de emergência eles tem tido problemas nos municípios vizinhos. “A gente para ser atendido em alguma emergência tem que se deslocar para a cidade de Pão de Açúcar em Alagoas que é a mais próxima, o problema é que os médicos lá não estão atendendo mais a gente porque eles
"Não temos saúde ", Ademar Ricardo
sabem que somos de Sergipe”, revela.
A única agente de saúde do quilombo, Inês dos Santos, informa a situação das pessoas que tem problemas de saúde no local e diz que já tiveram casos de infarto sem que nada pudesse ser feito. “Eu como agente de saúde tenho até vergonha de vestir a minha camisa, porque aqui é minha comunidade onde eu conheço todo mundo, todos são irmãos, primos ou amigos e me vejo de mãos atadas”, desabafa.
Inês conta que existem 31 pessoas hipertensas cadastradas e três diabéticos. “Aqui também temos crianças com problemas de verme e de pele, também não temos remédio para isso. Com relação a marcação de exames, se você for até Porto da Folha tem que ir de madrugada pois eles distribuem apenas 15 senhas por dia, caso contrário você não marca. Após o dia 15 em diante acabou a cota e ninguém marca. Meu cunhado está doente e precisa urgentemente de um exame


para poder tomar um medicamento e até agora não conseguimos”, afirma.
Histórico
Quilombolas é designação comum aos escravos refugiados em quilombos, ou descendentes de escravos negros cujos antepassados no período da escravidão fugiram dos engenhos de cana-de-açúcar, fazendas e pequenas propriedades onde executavam diversos trabalhos braçais para formar pequenos vilarejos chamados de quilombos.
Mais de duas mil comunidades quilombolas espalhadas pelo território brasileiro mantêm-se vivas e atuantes, lutando pelo direito de propriedade de suas terras consagrado pela Constituição Federal desde 1988.


“No caso do Mocambo, eles já foram emitidos na parte da terra que pertence a eles. Tudo que está lá se torna da comunidade, é uma conquista maravilhosa, em muitos lugares a situação ainda está muito atrasada, mas aqui em Sergipe o Incra tem desenvolvido um ótimo trabalho com a produção dos Relatórios técnico de delimitação e identificação (RTID)”, destaca a procuradora Lívia Tinoco.
Não existe uma data de criação do quilombo do Mocambo, as pessoas mais antigas contam que há muito tempo o local era uma fazenda chamada Mocomba onde os negros fugiam da senzala e se refugiavam no local. Desde 1994 cerca de 20 famílias brigam pelo direito as terras que ficam ao redor da comunidade.
“As pessoas se sentiam daqui, tem uma raiz neste local e precisam plantar e criar porque até então não se tinha espaço e as terras vizinhas eram todas de fazendeiros. Então, essas famílias se agruparam formando um grupo bem forte e unido e começaram a lutar e buscar com entidades como a Fundação Palmares com o padre Izaías, o Centro José Brandão de Aracaju”, aponta Ademar Rosa.
A partir dessa época no início da década de 90, começaram os conflitos com os fazendeiros. “No começo muitas daqui foram ameaçados de morte, em todo o momento os jagunços dos fazendeiros estavam por aqui nos ameaçando, não foi fácil. Mas após 13 anos de luta que fizemos no dia 27 de maio e muito sofrimento nós conseguimos um pedaço de terra para plantar. A primeira fazenda foi a do ex-governador Seixas Dórea que ele mesmo procurou receber o seu recurso e nos repassou”, informa Ademar.
O presidente da associação continua e comenta que recentemente foram incorporadas terras de outras fazendas. “Recebemos na semana passada a terra de três fazendas das nove em que brigamos pela terra. Até então tínhamos cinco com a demarcação de 2.150 hectares isso no documento, mas não dispúnhamos nem de 500 hectares ainda, mas Incra agora está mais ativo e na semana passada foi assinado o decreto pelo presidente Lula e os fazendeiros já estão recebendo o recurso deles”, informa.
No dia em que a reportagem do Portal Infonet esteve na comunidade, uma equipe do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) esteve no local para vistoriar as duas igrejas que os moradores pleiteiam para serem tombadas. “Nós solicitamos ao governo o tombamento das duas igrejas da comunidade como patrimônio histórico, pois elas são muito antigas e nos reunimos com a comunidade e solicitamos. As duas chamam Sagrado Coração de Jesus, a padroeira é a gloriosa Santa Cruz que é a padroeira de todos os quilombolas”, finaliza o líder comunitário.
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