Comunidade quilombola está sem posto de saúde há 5 anos Atualmente a comunidade quilombola Mocambo em Porto da Folha vive um novo drama com relação à saúde dos moradores
Do Portal InfonetFoto Infonet
Distante 165 km de Aracaju, o município de Porto da Folha abriga o povoado Mocambo nas margens do Rio São Francisco que é formado por uma comunidade remanescente do antigo quilombo que o local abrigava. Como descendentes quilombolas, por lei a comunidade tem direito a propriedade de suas terras das quais eles brigam para poder utilizar desde a década de 90. Mas atualmente a comunidade vive um novo drama com relação à saúde dos moradores. O posto de saúde do povoado está desativado há cerca de cinco anos. Os atendimentos dos médicos do Programa Saúde Família (PSF) que se deslocam até a comunidade são realizados na sacristia.
O prédio do antigo posto não oferece condições mínimas de uso e necessita de uma reforma urgente que se prolonga enquanto os moradores permanecem desassistidos.
No final de abril a Defesa Civil de Porto da Folha vistoriou o prédio do antigo posto de saúde e atestou as condições como precárias. O laudo do engenheiro Cícero Leonardo de Menezes cita “A estrutura do Posto de Saúde se encontra totalmente em situação precária sem a mínima condição de funcionamento, com várias fissuras nas paredes de alvenaria e na base de sustentação do prédio com alto risco de desabamento, telhado muito danificado, banheiros destruídos, calçada com piso destruído e murada
prestes a desabar. Em conclusão a estrutura não oferece nenhuma condição de funcionamento sem que sejam feitas às reformas necessárias”, cita o laudo.
No dia 12 de agosto deste ano a prefeitura de Porto da Folha divulgou o resultado da licitação realizada através de uma carta convite no valor de R$ 11.788,47. “Tivemos que recorrer ao Ministério Público Federal para denunciar a situação, estivemos no mês de setembro com a procuradora e ela nos informou que o Prefeito mandou um ofício dizendo que a empresa que ganhou a licitação por um valor inferior a R$ 15000, o que não supre a necessidade do posto, porque não cabe reforma, mas uma construção porque está em Estado de decadência”, diz.
Outro problema é com relação a distribuição de medicamentos, já que desde o mês de março nenhum medicamento é encaminhado para os quilombolas, e para serem atendidos em caso de emergência eles tem tido problemas nos municípios vizinhos. “A gente para ser atendido em alguma emergência tem que se deslocar para a cidade de Pão de Açúcar em Alagoas que é a mais próxima, o problema é que os médicos lá não estão atendendo mais a gente porque eles
sabem que somos de Sergipe”, revela.
"Não temos saúde ", Ademar Ricardo |
A única agente de saúde do quilombo, Inês dos Santos, informa a situação das pessoas que tem problemas de saúde no local e diz que já tiveram casos de infarto sem que nada pudesse ser feito. “Eu como agente de saúde tenho até vergonha de vestir a minha camisa, porque aqui é minha comunidade onde eu conheço todo mundo, todos são irmãos, primos ou amigos e me vejo de mãos atadas”, desabafa.
Inês conta que existem 31 pessoas hipertensas cadastradas e três diabéticos. “Aqui também temos crianças com problemas de verme e de pele, também não temos remédio para isso. Com relação a marcação de exames, se você for até Porto da Folha tem que ir de madrugada pois eles distribuem apenas 15 senhas por dia, caso contrário você não marca. Após o dia 15 em diante acabou a cota e ninguém marca. Meu cunhado está doente e precisa urgentemente de um exame
para poder tomar um medicamento e até agora não conseguimos”, afirma.
Histórico
Quilombolas é designação comum aos escravos refugiados em quilombos, ou descendentes de escravos negros cujos antepassados no período da escravidão fugiram dos engenhos de cana-de-açúcar, fazendas e pequenas propriedades onde executavam diversos trabalhos braçais para formar pequenos vilarejos chamados de quilombos.
Mais de duas mil comunidades quilombolas espalhadas pelo território brasileiro mantêm-se vivas e atuantes, lutando pelo direito de propriedade de suas terras consagrado pela Constituição Federal desde 1988.
Não existe uma data de criação do quilombo do Mocambo, as pessoas mais antigas contam que há muito tempo o local era uma fazenda chamada Mocomba onde os negros fugiam da senzala e se refugiavam no local. Desde 1994 cerca de 20 famílias brigam pelo direito as terras que ficam ao redor da comunidade.
“As pessoas se sentiam daqui, tem uma raiz neste local e precisam plantar e criar porque até então não se tinha espaço e as terras vizinhas eram todas de fazendeiros. Então, essas famílias se agruparam formando um grupo bem forte e unido e começaram a lutar e buscar com entidades como a Fundação Palmares com o padre Izaías, o Centro José Brandão de Aracaju”, aponta Ademar Rosa.
A partir dessa época no início da década de 90, começaram os conflitos com os fazendeiros. “No começo muitas daqui foram ameaçados de morte, em todo o momento os jagunços dos fazendeiros estavam por aqui nos ameaçando, não foi fácil. Mas após 13 anos de luta que fizemos no dia 27 de maio e muito sofrimento nós conseguimos um pedaço de terra para plantar. A primeira fazenda foi a do ex-governador Seixas Dórea que ele mesmo procurou receber o seu recurso e nos repassou”, informa Ademar.
O presidente da associação continua e comenta que recentemente foram incorporadas terras de outras fazendas. “Recebemos na semana passada a terra de três fazendas das nove em que brigamos pela terra. Até então tínhamos cinco com a demarcação de 2.150 hectares isso no documento, mas não dispúnhamos nem de 500 hectares ainda, mas Incra agora está mais ativo e na semana passada foi assinado o decreto pelo presidente Lula e os fazendeiros já estão recebendo o recurso deles”, informa.
No dia em que a reportagem do Portal Infonet esteve na comunidade, uma equipe do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) esteve no local para vistoriar as duas igrejas que os moradores pleiteiam para serem tombadas. “Nós solicitamos ao governo o tombamento das duas igrejas da comunidade como patrimônio histórico, pois elas são muito antigas e nos reunimos com a comunidade e solicitamos. As duas chamam Sagrado Coração de Jesus, a padroeira é a gloriosa Santa Cruz que é a padroeira de todos os quilombolas”, finaliza o líder comunitário.
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