domingo, 19 de dezembro de 2010

BOMBA


Mais de 80 jovens serão mortos em Aracaju
Do JC on line
Cada vez mais, os adolescentes são vítimas de homicídios, principalmente no Nordeste do país. É o que confirma o estudo ‘Homicídios na Adolescência no Brasil: IHA 2005 / 2007’, publicado este mês pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. Somente nas capitais, mais de 15 mil deverão morrer assassinados até 2013. Para conter a previsão dramática, especialistas no assunto afirmam ser preciso mais políticas públicas voltadas a essa faixa etária.
O estudo da Secretaria de Direitos Humanos mostra que a violência entre os jovens de 12 a 18 anos vitima milhares de adolescentes anualmente. Com base em dados sobre homicídios coletados em todo o país, o estudo faz uma previsão dramática: se as atuais condições de vida dos adolescentes não sofrerem nenhuma alteração, até o ano de 2013, (contagem iniciada em 2007), a estimativa é de que 16.412 adolescentes morrerão somente nas 27 capitais brasileiras antes de completar 19 anos.
Como o estudo se debruçou somente sobre as cidades com mais de 100 mil habitantes, em Sergipe, apenas dois municípios participaram das estatísticas: Aracaju e Nossa Senhora do Socorro. Na capital, onde vivem mais de 60 mil adolescentes, a tendência apontada pela Secretaria de Direitos Humanos é de que 84 jovens com idade entre 12 e 18 anos sejam vítimas de homicídio até 2013. Em Socorro, o índice é proporcionalmente maior: com população estimada em pouco mais de 25 mil adolescentes, pelo menos 69 deles devem ser assassinados dentro desse período de sete anos.
Embora apresente índices inferiores ao de outras capitais do Nordeste, região mais violenta do país de acordo com o estudo, Aracaju mostrou uma elevação do IHA entre 2005 e 2007. Nesse período, a taxa subiu de 1,1 vítima de homicídio em um grupo de 1.000 adolescentes para 1,34. Em Socorro, houve uma escalada no mesmo sentido: o IHA subiu de 1,09 para 2,60 adolescentes assassinados a cada mil habitantes dessa faixa etária entre os três anos em que o estudo foi desenvolvido.
Ainda assim, tanto em termos absolutos como relativos, Aracaju ainda se encontra em posição confortável em relação a outras cidades. Na região, por exemplo, Recife e Maceió se destacam negativamente no estudo, com taxas de homicídio superiores a 7 mortes por grupo de cada mil adolescentes. Na capital pernambucana, 1.351 adolescentes devem ser assassinados nos próximos sete anos. No Rio de Janeiro, com IHA calculado em 4,9, mais de 3 mil adolescentes devem ser vítimas de homicídio até 2017.

Perfil
A violência é apontada como a principal causa da mortalidade entre adolescentes. Os homicídios respondem por 44,5% das mortes entre os 12 e 18 anos. O estudo aponta que mortes naturais (26,5%), acidentes (23,2%) e suicídios (2,9%) não causam o mesmo impacto da violência urbana na vida dos jovens. Além disso, o estudo apontou que o risco de os adolescentes do sexo masculino serem vítimas de homicídio é doze vezes maior do que entre as adolescentes. Entre os negros, o risco de ser assassinado é quatro vezes maior que em outros grupos. A arma de fogo também é apontada como meio mais utilizado.
O delegado Everton Santos, coordenador do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) da região metropolitana de Aracaju, diz que, apesar dos índices alarmantes apontados pela publicação da Secretaria de Direitos Humanos, Sergipe se encontra em posição ainda confortável nesse quesito, seja na capital ou no interior. “São poucos os casos em que temos adolescentes como vítimas de homicídio. E os casos normalmente são pontuais, provocados por motivos pessoais. É mais comum isso ocorrer com jovens maiores de 18 anos”, afirmou Everton. “Este ano, 90% dos casos de homicídios de adolescentes envolveram brigas de torcidas”,
complementou o delegado.
O delegado Everton Santos faz também outra análise sobre o perfil dos adolescentes que se envolvem em homicídio, seja como vítima ou como autor. Com base em sua experiência à frente da delegacia, ele diz que o assassinato dificilmente é um ato isolado. “O que fomenta o homicídio é a participação em outros crimes. A vítima, por exemplo, é muitas vezes o usuário de droga que
não pagou a sua dívida na boca de fumo”, afirmou.
As professoras Joelina Menezes e Denise Leal Albano, respectivamente coordenadora e vice-coordenadora da Rede Nacional de Altos Estudos em Segurança Pública (Renaesp) em Sergipe, ressaltam que os índices apontados pelo estudo refletem fielmente a realidade. “É um índice preocupante. Os números confirmam que é na faixa etária entre 14 e pouco mais de 20 anos onde se concentram tanto os autores quanto as vítimas de homicídio”, afirmou Denise Leal.
Para o coordenador do DHPP, a falta de recursos e autonomia dos adolescentes dificulta a entrada dessa faixa etária na criminalidade e no mundo da violência. “O jovem não pode consumir álcool nos bares, não tem recursos para sustentar um vício ou adquirir uma arma de fogo”, explica Everton Santos. A informação é corroborada por Denise. “Após um estudo, identificamos que a maior parte dos adolescentes no Cenam haviam sido internados por crimes contra o patrimônio”, declarou.
Legislação
Em uma de suas atividades acadêmicas como professora do curso de Direito, Denise Leal levou seus alunos a conhecer diversas unidades da rede de proteção à criança e ao adolescente, entre eles o Conselho Tutelar e a Vara da Infância e da Juventude. Ela conta que a impressão dos estudantes ratificou o seu pensamento, ficando claras as carências nessa área.
“Os alunos viram que existe um fosso entre a norma e a ação. A lei ainda não consegue ser executada na íntegra”, afirmou a professora. “O Cenam [Centro de Atendimento ao Menor] e as unidades de internação em todo o país, de uma maneira geral, ainda não oferecem as condições adequadas para os adolescentes infratores. Além disso, as medidas ainda possuem caráter mais punitivo do que educativo, favorecendo um ciclo vicioso em que o adolescente volta a repetir os seus atos infracionais”, completou Denise Leal.
Para exemplificar a distância entre a lei e sua execução, a vice-coordenadora da Renaesp ressalta que o tratamento legal dado aos adolescentes ainda é muito precário. “A polícia trata essa faixa etária de forma autoritária, apreendendo sem motivo. Além disso, o Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece que a internação do jovem é uma medida que só deve ser tomada em caso de atos infracionais envolvendo violência ou ameaça. No entanto, hoje muitos adolescentes são internados por tráfico de drogas, mesmo às vezes sendo apenas usuário”. A justificativa: o tráfico é uma violência à sociedade. “É um malabarismo para retirá-lo do convívio familiar”, lamenta Denise.
Futuro
Para controlar a violência, o delegado Everton Santos afirma que tanto a polícia quanto à Justiça precisam mostrar exemplarmente à sociedade que os autores desses homicídios não estão livres de punição. “É preciso estudar as áreas críticas e aumentar o policiamento ostensivo nessas áreas. Além disso, é preciso que a Justiça e o sistema penitenciário mantenham os autores desses homicídios presos, para que não se crie uma impressão de impunidade e incentive outras pessoas a cometerem os mesmos crimes”, afirmou.
Ele admite, porém, que somente a repressão não é suficiente para amenizar a violência, um problema que envolve uma situação social mais complexa. “O Estado tem uma responsabilidade muito grande, pois tem que oferecer alimentação, moradia, educação, saneamento básico, emprego e renda. Hoje, com os programas sociais, focados na renda e na profissionalização, acredito que a tendência é que os índices de violência diminuam”, declarou.
Para a professora Denise Leal, vinculada ao Departamento de Direito da Universidade Federal de Sergipe, os índices de homicídios apontam para a necessidade de políticas públicas voltadas à adolescência. “As comunidades precisam ter acesso a escolas, praças, postos de saúde e bens culturais para que os adolescentes tenham uma formação adequada. É preciso garantir aos jovens a cidadania tutelada, com adultos representando e reivindicando os seus interesses”, pontua.
Na área da saúde, Denise lembra que ainda existem algumas carências que precisam ser sanadas. “Certamente, existem avanços, principalmente para grupos como gestantes e recém-nascidos, mas ainda faltam políticas de saúde mais efetivas para os adolescentes em relação ao uso de drogas e tratamento terapêutico”, declarou a vice-coordenadora da Renaesp.
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